É normal que, depois de alguns meses ou até mesmo anos de caminhada, de acordo com o estado inicial de cada pessoa, haja um deslocamento maior visando a corrida. Este momento de mudança, se é magico por um lado, deve ser observado com muito cuidado para que traga consequências agradáveis e positivas para todos. Isso porque este novo estágio, que deveria ser visto como o elemento mais fundamental para a elevação dos níveis de saúde, acaba sendo uma verdadeira tortura para o seu corpo, trazendo todo tipo de lesões e impedimentos – muito deles, para sempre. É impressionante o que as pessoas fazem com seu organismo, correndo como loucos, achando que sem sofrimento e mesmo dor irá haver melhora na performance.

Não podemos esquecer que o grande Ayrton Senna foi um corredor de distâncias incríveis num tempo bárbaro e nunca, em mais de dez anos, sofreu sequer um única lesão. Nunca se machucou em todos os anos que trabalhamos juntos. Tenho um contato intenso com atletas dos mais variados esportes que estão sempre lesados em suas corridas de preparação física e me procuram para consertar o que está errado. Em meu consultório, escuto histórias estarrecedoras de pessoas que foram até seu último esforço, lesionando-se de tal maneira que colocaram sua própria vida desportiva em jogo.

As pessoas podem, sim, correr com velocidade. Apenas necessitam estar melhores preparadas para que isso ocorra de forma natural. A melhoria de sua corrida não pode vir por meio do seu sacrifício, dor e sofrimento, mas sim tão somente como resultado da melhoria da eficiência de todo o seu aparelho cardiovascular. Temos então que estar sempre atentos em não ultrapassar aquela faixa que nos deixa em estado agradável e de total equilíbrio de oxigênio para, gradativamente, desenvolvermos melhor capacidade de bombeamento do coração. Dessa forma, haverá uma perfeita “alimentação” de todos os tecidos de seu corpo, inclusive de seus músculos, resultando em mais performance.

Esta cultura social da malhação põe tudo a perder, pois muda totalmente os valores verdadeiros da corrida. Está tudo invertido! Não se corre forte para aumentar sua eficiência orgânica, e sim se aumenta sua eficiência orgânica para correr forte. Este é a grande confusão que muitos fazem desenvolvendo uma corrida exagerada, que é uma tortura eterna. Que busca os resultados pelo sofrimento e não da eficiência de seus órgãos.

A evolução na corrida não pode ser conseguida por meio desse caminho de sofrimento. Para que a atividade física possa oxigenar todos os seus tecidos, levar à sua corrente circulatória os hormônios mais encantadores, que vão dar brilho e alegria à sua vida, é necessário paciência. Nunca busque sua evolução “à força”, mas sim pela melhoria de todo o seu organismo, que somente pode ser aprimorado com treinos leves e agradáveis, da forma mais natural possível. Então, meu querido leitor, vá devagar para ir longe, buscando a alegria e o bem-estar por todo o percurso de sua vida.

(Texto publicado na coluna Chegada da edição 128, de dezembro de 2013, da revista O2)