Uma vez vi uma entrevista do Gilberto Gil em que ele falava de um de seus filhos. “Era um cara bonito, atleta, tinha pescoço largo”, tudo no passado, porque o moço havia morrido. Tirando a parte da tristeza, outra coisa me chamou a atenção. O tal do pescoço largo. Corri para o quarto, acendi a luz, olhei no espelho e o meu estava lá: pescoço largo e definido. “Não tanto quanto o do Mo Farah. Mas tô no caminho do treinamento certo”, pensei eu.

O raciocínio é simples. Se a definição irradiou para a região pescoçal, imagine o que aconteceu com o resto do seu corpo. O pescoço é um coitado, vive sendo ignorado. Você não ouve com frequência alguém dizendo: fortaleça o pescoço, faça o exercício tal para o pescoço, você está com o pescoço flácido, passe este creminho no pescoço. Mas você ouve nego falando de todas as outras partes do corpo. É como se o pescoço fosse na onda do resto do corpo. Fortaleça as panturrilhas que, de alguma forma, a força feita chega lá. Pior que chega. Porque o pescoço é humilde e generoso. E olha que louco: apesar de estar numa região visível e descoberta, é pouco reconhecido. Uma pena.

Toda vez que um sujeito me diz que treina e faz 10 km em 23 minutos, dou uma olhadela no pescoço do dito. Até fiz uma métrica para me ajudar nessas horas:

1. Se o pescoço do campeão ou da cigana for igual ao da minha mãe, a pessoa está mentindo;

2. Se for igual ao meu, também está mentindo, porque eu até tenho pescoço, mas não tenho este pace;

3. Maaaaassss, se for bonito, delineado e estruturado, nem precisa me mostrar o relógio. Estou a acreditar.

Baseada nestes três pontos, joguei fora aqueles medidores de gordura corporal ou fita métrica. Pescoçuda = treinando legal. Pescoço frouxo = aperta os treinos. Virou meu novo medidor, o medidor pescoçal. Aliás, pode reparar nos retratos da galera desta edição. Adiante algumas páginas, eu espero. Você vai ver uns pescoções bonitos, delineados, grossos. Na base tem um “V” que some ali na metade do caminho até a cabeça, coisa linda de ver.

E, se o pescoço está fortalecido, o mesmo acontece com a nuca, outra parte do corpo esquecida e igualmente importante, mas que a gente só se lembra dela numa crise de torcicolo. São os dois lados da moeda, que é um corpo atlético. Eu diria até que a dupla pescoço-nuca forma a base deste corpo.
Nada de coluna vertebral, pé ou a região pançal, que foi gourmetizada para core. Sem esta dupla, nenhum desses quilômetros que você corre hoje seria possível.

Por enquanto, esta tese é só uma tese. Logo a ciência coloca luz nesta ideia. Já posso até imaginar a Nasa olhando para toda a química envolvida na dupla, a Sorbonne desenvolvendo papers em aulas de pós-mestrado e a Universidade de Praga fazendo testes ergométricos. Se é que já não estão fazendo isso.

Faça o teste você mesmo usando seu medidor pescoçal. Compare seu pescoço com seu próprio pescoço dos tempos em que treinar não fazia parte da sua agenda. Vire a cabeça para a direita, esquerda, procure o “V” que nasce na base da garganta. Sorria. Você foi aprovado pelo teste do medidor pescoçal.