A emoção de cruzar a linha de chegada

Atualizado em 29 de julho de 2016
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Há menos de um ano, a controller paulista Michele Pimentel, de 26 anos, tomou uma decisão: viajaria para os Estados Unidos para participar da Maratona de Chicago, um sonho antigo desta apaixonada por corrida. “Foram 10 meses de disciplina e foco”, conta. No meio da jornada de preparação, alguns percalços, como um estiramento na lombar que a deixou parada por algumas semanas. Michele corre há três anos e partiria para a sua segunda maratona – a primeira foi a de Curitiba em 2005. O objetivo: sentir a emoção de cruzar a linha de chegada de uma grande prova. “Eu fechava os olhos, respirava fundo e imaginava o grande dia”.

A lesaõ na coluna não abalou os planos de Michele. “Eu não pensava na hipótese de não competir na prova, mas entendi que precisava aprender a respeitar meus limites. Neste período conversei muito com meus treinadores, Diego e Paulinho, e meu médico ortopedista, Dr. Clauber, que me deram um grande apoio e me ensinaram a curtir mais este momento preparatório, sem me preocupar tanto, e aos poucos fui retornando os treinos, à medida que a dor amenizava”, conta.

Por falar em treino, Michele diz que cada um é único e especial. “É um momento completo da conexão com o que se quer realizar, seja um trotinho de 40 minutos ou um longo de 30 km, este último, no meu caso, havia feito somente uma vez devido a lesão, mas foi suficiente e serviu para mostrar que o importante não seria a preocupação com o tempo, mas sim completar a prova bem e realizada”, diz.

Em Chicago – Michele conta que chegar em Chicago foi algo mágico, primeiro, porque se sentia preparada para a prova que iria disputar dentro de algumas horas e, segundo, pela grande festivamente que toma conta da cidade por causa da maratona. “As pessoas vivem a maratona, o ar já tem cheirinho de prova e quando fomos à feira senti que o momento realmente estava próximo e, claro, chorei de emoção”, conta.

Michele, como os outros 36 mil corredores que participaram da prova, sofreu com o calor em torno de 35º que fez na cidade, surpreendente para esta época do ano, mas já previsto pela meteorologia local. A organização estima que os outros 10 mil corredores inscritos que não compareceram à prova foi por conta do forte calor.

“Foi dada a largada e antes da primeira milha já senti que não seria fácil, a temperatura estava alta e a umidade também, mesmo assim, com tanta emoção passei as primeiras milhas num ritmo alto para o que havia planejado, após a 4ª já estava mais calma e consegui começar a controlar meus batimentos. O encanto das pessoas na rua, gritando e impulsionando os corredores é contagiante, são crianças, homens e mulheres de todas as idades, buscando com alegria ajudar os grandes guerreiros”, conta Michele.

Go Champions! You can do it! All you are winner! – Com esse incentivo Michele disse que precisou se esforçar para conter o choro e focar no ritmo da prova e ter que começar a lidar com o calor que ficava mais forte rapidamente. “Infelizmente o calor aumentou muito rápido e, por conta disso, a distância de um posto para o outro começou a ficar longa demais para pegar água. Aos poucos fui perdendo meu ritmo e comecei a sentir fortes dores no ciático. Até esse momento o ritmo estava ótimo para eu tentar fazer a prova em 4 horas, mas fechei os olhos e comigo mesma entrei em comum acordo: Corro pelo prazer, pelo amor de sentir e curtir algo como aquele momento…chegar antes ou depois do planejado naquelas circunstancias não seria o diferencial. Decidi simplesmente completar, algo que não foi fácil, pois por diversas vezes tive medo de não conseguir”, relembra.

“Na milha 18, que já correspondia a quase 30 km lembrei que faltariam somente mais 2 voltinhas de 6 k da USP, e aos poucos fui buscando ficar mais centrada, pois as pessoas já demonstravam preocupação com o calor, umas paravam, outras se jogavam no chão, famílias na rua com a mangueira de água tentando aliviar um pouco a grande exaustão dos corredores e logo em seguida comecei a ouvir reclamações dizendo que a prova seria cancelada”, conta

“Fiquei apavorada com tudo que estava acontecendo e lembro que quando estava na milha 22 me desliguei de tudo: dores, exaustão, calor, preocupação e busquei visualizar apenas o momento de tirar da cintura a bandeira do Brasil e estendê-la na linha de chegada, mas confesso que houve instantes que até ela ficou pesada e quase a joguei fora”.

“Faltava 1 km e quando cruzei a última esquina antes da reta final puxei a bandeirinha Linda, toda molhada e pesada, beijei-a e agradeci por não tê-la deixado ir, estendi bem alto e corri os últimos 200 m com um calor profundo, mas não esse que atormentou a prova e impediu muitos de completarem seu objetivo. Foi um calor de vitória, um calor de conquista, um calor que brota de dentro e resplandece toda vez que um sonho se concretiza”, conta emocionada. Michele terminou a prova em 4h34min47s.