Comrades Marathon: a ultra faz história

Atualizado em 26 de abril de 2016

Comrades Marathon, uma prova que atrai o olhar de muitos corredores que gostam de longas distâncias e que querem correr em um cenário incrível: a África do Sul. Com o tempo de 9h9min, Mirlene Picin foi a melhor brasileira na prova em 2015. Ela foi a 177ª mulher a cruzar a linha de chegada entre as 3.456 que largaram. Na categoria, foi a 105ª colocada, dentre as 1.512 corredoras. Essa foi a primeira prova com maior quilometragem realizada pela atleta acostumada com corrida de montanha e provas de longa distância. Por conta disso, Mirlene sofreu bastante na sua “peregrinação”.

Você vai entender já, já no relato aí embaixo onde ela explica como chegou à Comrades Marathon, reflete sobre a real importância da ultramaratona na vida de um corredor e conta como foi sua experiência na corrida de 89 km. Agora, as palavras de Mirlene:

Os dias seguintes à prova foram bem parecidos. Desde as conversas com outros brasileiros no aeroporto de Durban na terça até a publicação das notícias de que eu teria sido a melhor brasileira na prova, todos queriam saber: afinal de contas, como é correr 89 km? Quem não é corredor, logo de cara, com as primeiras trocas de palavras, me chama de maluca. Os corredores, com meia-dúzia de palavras, também logo soltam a frase: você é maluca. Apenas um pequeno grupo de pessoas, que já fez ou está planejando uma ultra, tem opiniões e comentários diferentes.

Como fiquei de cama alguns dias depois da prova, (a minha imunidade caiu e um cansaço enorme tomou conta de mim), tive bastante tempo para pensar sobre o assunto e tentar responder à enxurrada de mensagens e e-mails que recebi sobre a prova.

E sabe a que conclusão cheguei? Nenhuma. Só reflexões, nada de uma resposta definitiva, talvez por conta da minha história com a corrida.

Eu não era corredora. Na verdade, até hoje tenho lá minhas dúvidas se sou realmente uma. Eu levo uma vida bem dividida. Como a maioria aqui, estudo e trabalho, e no esporte divido meu tempo com duas atividades completamente diferentes. No verão, eu corro e, no inverno,  eu esquio. Com isso, eu não consigo ser uma especialista em nenhuma das duas modalidades, mas é assim que vou seguindo.

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Um dia, em um passado não muito distante, eu não corria, não gostava de correr e não tinha interesse algum nesse esporte. Eu patinava. Queria deslizar. E os patins me levaram ao esqui. E, para melhorar no esqui e me manter na equipe nacional, eu precisava melhorar muito minha condição física. Com a corrida eu conseguiria alcançar esse objetivo.

Juntei a minha necessidade de melhorar no esporte a um preparador físico que adorava correr. Ele vivia me contando suas histórias de corridas. Foram essas histórias que me levaram a minha primeira prova de rua de 10 km, em setembro de 2010. Até 2013, competi em pouquíssimas provas, pois o foco era o esqui. Mas, de 2013 pra cá, os tênis foram me despertando cada vez mais interesse e, em março do mesmo ano, eu realizava a minha primeira ultra (os 56 km da Two Oceans). Depois dela, foram duas maratonas (Porto Alegre, em 2014, e Boston, em 2015), várias provas de montanha e rua de média distância, uma ultra de 50 km em Paraty (RJ)… até que chegou a Comrades Marathon.

Escrever aqui como foi a prova, meus treinos, estratégia nutricional, quantas batatinhas cozidas eu comi e quantos litros de Coca-Cola eu tomei durante o percurso, não vai agregar em nada às pessoas. Quanto caminhei, se tive bolhas ou não? Depoimentos assim você vai encontrar aos montes.

Eu, na realidade, gostaria de fazer as pessoas pensarem se é necessário mesmo realizar uma ultra. Vivemos em um mundo onde tudo é “over” e todos querem pular etapas, na escola, no trabalho, na vida. Muitos corredores mal saíram dos seus 10 km na rua e já estão falando em fazer uma ultra. Será que há essa necessidade? Nem todos têm o perfil, o espírito, a vontade de correr essa distância.

Sou a favor do sonho e da busca desse sonho. Se eu não fosse assim, eu não teria começado a minha história lá trás com o esqui… e por mais estranho que pareça, foi o esqui que me trouxe até aqui. Se não tivesse começado a esquiar, provavelmente eu não teria cruzado a linha de chegada em Pietermaritzburg, no dia 31 de maio, no pórtico da Comrades Marathon.

Sofri muito durante a prova. Sofri bastante antes dela também, pois por conta de uma lesão não pude fazer os treinos que deveria. Não fiz a prova que queria, não terminei no tempo que eu esperava, muito coisa deu errado. As coisas, na maioria das vezes, não saem como a gente quer.

E se nesse momento você pode estar cheio de dúvidas se parte para sua ultra ou não, posso dizer que também são minhas essas dúvidas: se volto para o meu Back to Back lá na África do Sul em 2016, nome dado a quem repete a prova depois de uma primeira experiência.

A única certeza que eu tenho é que essa prova é mais uma peregrinação do que uma competição. O sul-africano é apaixonado por ela, e nós corredores, logo de cara, compreendemos essa relação do povo com a Comrades Marathon. Mas, para isso, é preciso “peregrinar” pelos 89 km.”

Você também quer contar sua história em uma prova bacana? Mande um e-mail com o assunto “Eu fui” contando todos os detalhes da prova e com fotos do percurso. Quem sabe você não é o próximo a contar a sua história aqui?

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