Treinamento intervalado de alta intensidade para corridas

Atualizado em 12 de dezembro de 2017
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Tradicionalmente, o método de treinamento intervalado tem sido empregado de maneira muito subjetiva no treinamento esportivo. Apesar dessa metodologia ser aplicada no cenário esportivo desde a década de 1960, ainda existem muitas deficiências na maneira de prescrever e controlar a carga de treinamento.

Assim, com o intuito de diminuir a grande subjetividade desse método e proporcionar maiores efeitos de treinamento, muitos cientistas do esporte vêm desenvolvendo pesquisas utilizando essa metodologia de treinamento em conjunto de variáveis fisiológicas que apresentam alta reprodutibilidade e, também, validade na predição do desempenho em provas de média e longa duração.

Basicamente, esse artigo abordará o método de treinamento intervalado de alta intensidade e sua efetividade de aplicação quando utilizado em conjunto de variáveis fisiológicas precisas. No entanto, para uma melhor compreensão do assunto, inicialmente apresentaremos como são determinadas essas variáveis e o conceito de cada uma delas.

Para a determinação do Consumo máximo de oxigênio (VO2max), da Velocidade correspondente ao consumo máximo de oxigênio (vVO2max) e do Limiar Anaeróbio (LAn) é realizado um teste progressivo (com aumento progressivo de velocidade) em uma esteira ergométrica. A velocidade inicial utilizada para atletas treinados geralmente é entre 12 e 14km/h, com incrementos de 1km/h a cada 3 minutos até à exaustão voluntária.

Entre cada estágio (cada 3 minutos) há um intervalo de 30 segundos para a coleta de sangue do lóbulo da orelha para a dosagem do lactato sanguíneo. O indivíduo que realiza o teste tem um equipamento acoplado nas suas vias de respiração (máscara na região da boca e do nariz) e ligado a um computador que armazena os valores de gás expirado respiração a respiração durante todo o teste. O VO2max é o maior valor de consumo de oxigênio obtido durante todo o teste, a vVO2max é considerada como sendo a velocidade de exercício na qual ocorre o VO2max e o LAn é a mais alta concentração de lactato sangüíneo e velocidade de exercício que apresenta um equilíbrio do organismo no que diz respeito à liberação e a remoção do acido lático que é produzido nos músculos durante o processo de produção de energia (determinado a partir da análise do sangue).

Para a determinação do Tempo de sustentação na velocidade referente ao consumo máximo de oxigênio (Tlim), realiza-se um teste (em um outro dia) com a velocidade da esteira ajustada na vVO2max (encontrada no teste progressivo) e o indivíduo se exercita nessa velocidade até a exaustão, sendo registrado o tempo total de permanência durante o exercício. Visto que os testes são de caráter máximo, é necessário um intervalo de 48 horas entre cada teste para que o indivíduo consiga se recuperar totalmente e não apresente influência na determinação dos resultados.

Conceitualmente, o VO2max pode ser definido como a máxima capacidade de captação (pulmões), transporte (coração e vasos) e utilização do oxigênio (principalmente pelos músculos), durante exercício dinâmico, envolvendo grande massa muscular corporal. É a variável fisiológica que melhor representa a potência aeróbia, ou seja, é uma medida da quantidade máxima de energia que pode ser produzida pelo metabolismo aeróbio em uma determinada unidade de tempo.

Já a capacidade aeróbia, indica teoricamente a quantidade total de energia que pode ser fornecida pelo metabolismo aeróbio, podendo ser bem estimada pelas variáveis associadas à resposta do lactato sangüíneo durante o exercício submáximo (representada pelo LAn). No entanto, para a uma prescrição mais precisa do treinamento, vem se utilizando a vVO2max e o Tlim, sendo que esse tem sido um assunto central de diversos estudos.

Parece consenso para muitos pesquisadores que o treinamento intervalado de alta intensidade é indispensável para a melhora do desempenho aeróbio em diferentes modalidades esportivas, principalmente em provas com duração superior a 1 minuto (ex: corridas de média e longa duração).

Desta forma, alguns estudos sugerem que o treinamento intervalado seja realizado em séries de cinco repetições com as seguintes características: velocidade – 100% vVO2max, duração – 60% Tlim e recuperação ativa – 60% vVO2max, com a mesma duração do exercício.

Este modelo de treinamento é interessante porque a vVO2max tem sido proposta como a velocidade de corrida na qual o indivíduo consegue atingir e manter o maior tempo possível o VO2max. Além disso, parece que 60% Tlim é o tempo necessário para que o VO2max possa ser atingido durante o exercício e sustentado durante um período que poderia determinar a melhora do VO2max, da vVO2max e do desempenho. Assim, quando o objetivo é atingir e manter o VO2max, a vVO2max pode ser utilizada, visto que ela pode proporcionar uma maior sobrecarga sobre o sistema aeróbio.

Em alguns estudos desenvolvidos com corredores bem treinados em provas de média e longa duração, realizou-se esse tipo de treinamento intervalado de alta intensidade (uma sessão semanal) combinado com o treinamento contínuo de intensidade moderada a 60 – 70% da vVO2max (quatro sessões semanais com 60 minutos de duração) e treinamento intervalado de longa duração (uma sessão semanal com 2 x 20 minutos a 85% da vVO2max com 5 minutos de intervalo entre as séries, sendo essa intensidade de 85% da vVO2max representante da velocidade do LAn) por um período de quatro semanas.

Os resultados encontrados apresentaram uma melhora significativa do VO2max, da vVO2max e do desempenho, sendo concluído então que a aplicação do treinamento intervalado de alta intensidade utilizando uma sessão semanal proporciona melhora significante no desempenho aeróbio de corredores bem treinados. Contudo, é importante ressaltar que esse tipo de treinamento deve ser aplicado combinado com o treinamento contínuo de intensidade moderada, além do que, mais de duas sessões semanais de treinamento de alta intensidade pode levar os atletas ao overtraining (supertreinamento) e conseqüente diminuição do desempenho. Sendo assim, é fundamental que as avaliações sejam efetuadas por profissionais especializados, realizando estas com elevada precisão, assim como, interpretando os resultados de maneira correta para uma posterior prescrição das sessões de treinamento, visto que o sucesso e o overtraining estão bem próximos.

Laboratório de Esforço Físico (LAEF) da UFSC
Kristopher Mendes de Souza (e-mail: kristophersouza@yahoo.com.br)
Juliano Fernandes da Silva
George Vieira
Francimara Budal Arins
Dr. Luiz Guilherme Antonacci Guglielmo (Doutor em Fisiologia do Exercício)
O Laboratório de Esforço Físico (LAEF) da Universidade Federal de Santa Catarina é um Laboratório de Pesquisa em Fisiologia do Exercício que envolve a participação de professores doutores, mestrandos e alunos de graduação na área de Educação Física. Os participantes trabalham com base em variáveis fisiológicas relacionadas com a performance principalmente nas modalidades de corrida, ciclismo, natação e triathlon.