Reprodução/InstagramFoto: Reprodução/Instagram

Da roça para uma major: a história de Cipó, o melhor brasileiro em Berlim

Atualizado em 20 de setembro de 2018
Mais em Papo de Corrida

O pernambucano Wellington Bezerra da Silva, o Cipó, desembarcou no Brasil no início desta semana com o 11º lugar na Maratona de Berlim, melhor colocação de um brasileiro na prova, e o recorde pessoal de sua vida nos 42.195 metros (2h13min43s). Há uma década, figurar entre os melhores do mundo na modalidade e estar na mesma prova em que Eliud Kipchoge quebrou o recorde mundial era um sonho distante para um rapaz que colhia milho e feijão na roça de Tupanatinga, no interior de Pernambuco.

A corrida foi uma paixão despretensiosa que brotou na vida de Cipó aos 19 anos. Em 2007, sem supervisão ou meta específica, ele começou a percorrer de 10 a 12 km no trajeto que separava a zona agrícola em que passava boa parte de seus dias de sua casa.

Em 2008, pouco mais de um ano depois de pegar gosto pela corrida, ele decidiu participar da prova mais tradicional de corrida do Brasil, a São Silvestre. O que era apenas uma visita a São Paulo transformou a vida deste pernambucano e, anos depois, o transformaria em um dos melhores maratonistas do país.

 

 

Em êxtase com seu desempenho na São Silvestre e a atmosfera da corrida, Cipó decidiu arriscar e comunicou a família que não voltaria à roça. Enquanto não recebia uma chance em uma equipe de atletismo, fez bicos como jardineiro. Os serviços de jardinagem duraram entre 2009 e 2010, ano em que pintou a chance que ele tanto esperava.

Chamado para integrar a equipe do Grêmio Barueri, ele finalmente poderia se dedicar exclusivamente ao esporte. O bom desempenho pela equipe paulista rendeu um convite para ser atleta do Cruzeiro em 2015. E foi com a camisa azul que decolou e entrou de vez no rol dos grandes maratonistas nacionais.

 

 

Em franca evolução, Cipó é o atual campeão das Dez Milhas Garoto, no Espírito Santo, e o vice da Maratona de São Paulo e na Meia Maratona do Rio. Até o 11º lugar em Berlim, nunca havia corrido antes abaixo das 2h16min. São os tempos cada vez melhores que o levam a pensar em um bom resultado nos Jogos Olímpicos de Tóquio, em 2020.

“Aos 27 anos, eu vi que a única chance que eu tinha de ser um atleta olímpico era na maratona. Eu não sou um cara naturalmente rápido. Nos 10 mil metros, tenho 29min25s [como melhor tempo]. Na maratona, eu vi que me saía melhor. A partir do ano que vem, tenho o planejamento de competir menos e focar nas provas de nível mais elevado, que podem melhorar a minha performance. Sonho com uma medalha em Tóquio. Sei que é difícil, mas não é impossível”, diz.

Preparação para Berlim e contratura muscular

Cipó iniciou sua preparação para a major alemã em julho e teve cargas semanais com até 190 km. Boa parte dos treinos foi feita em Campos do Jordão, com altitude, temperaturas baixas e três sessões de tiros por semana. Na primeira sessão, fazia de 20 a 30 tiros de 400 metros. Na segunda, eram de 10 a 15 tiros de 1.000 metros. Em alguns momentos, foram quatro sequências de 3 mil metros.

Ao chegar na Alemanha, ele se sentia preparado para finalizar os 42.195 metros na casa das 2h11min. Isso só não foi possível porque, no km 37, Cipó perdeu um pouco o ritmo em razão de uma contratura muscular. Ainda assim, alcançou a melhor marca de sua vida e saiu de Berlim cheio de planos para o futuro, como disputar uma outra major no primeiro semestre de 2019.

Contato com Kipsang

Além do 11º lugar, Cipó comemorou o fato de ter tido contato com algumas das principais referências das grandes maratonas, casos de Wilson Kipsang, vencedor de cinco edições de majors, e Patrick Sang, técnico de Eliud Kipchoge, que quebrou o recorde da prova no último domingo.

 

 

Após a prova, Cipó encontrou com Kipsang em um bar – momento registrado pelo pernambucano em suas redes sociais.

“Eu e ele [Kipsang] passamos a conviver lá no hotel. Foram três ou quatro dias de convívio. Falamos pouco sobre corrida, mas o Kipsang é um cara muito humilde. Foi nessa hora que eu percebi que vale a pena acreditar nos nossos sonhos. Eu saí lá da roça e hoje estou lado a lado com atletas que eu via pela TV. Depois da maratona, ele estava tomando um chope lá no bar. Ele merecia relaxar, foi o vice-campeão [risos]”, afirmou.