Nutrição

Tudo para você comer melhor e sem culpa

Excesso de treino, como sabemos, é prejudicial à saúde. Mas o excesso de informações desencontradas (na verdade, desinformação) sobre nutrição tende a ser ainda mais nocivo, o que impede que as pessoas tenham uma alimentação saudável.

Dietas das celebridades, dicas de blogueiros fitness, suplementos que prometem emagrecer são apenas algumas das armadilhas que podem até entregar resultados rápidos, mas também podem ser prejudiciais para a saúde.

Por isso, o melhor caminho é entender o papel dos nutrientes no seu corpo e se libertar de algumas crenças que podem estar atrapalhando a forma como você se relaciona com a comida. Ouvimos nutricionistas gabaritadas que sepultam mitos sobre alimentação e transmitem conhecimento para você praticar o esporte em sua plenitude, comer bem e fazer escolhas mais saudáveis — e sem culpa.

 

O primeiro pilar da alimentação saudável: os macronutrientes

“Como o próprio nome sugere, os macronutrientes são aqueles que devemos consumir em maiores quantidades. São os carboidratos, proteínas e lipídios”, discorre Clarissa Hiwatashi Fujiwara, nutricionista do Departamento de Nutrição da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso).

Carboidratos

São o combustível do organismo, responsáveis por fornecer energia às células. Sob a forma de glicogênio, são armazenados no fígado. “E isso é bom. Constituem uma reserva preciosa, que pode ser acessada quando temos uma demanda muito rápida de energia”, ensina Clarissa.

Os carboidratos foram injustamente guindados à posição de vilões da vez por diversos autores de dietas milagrosas. Nos anos 1970, esse papel era exercido pelas gorduras, que viraram sinônimo de palavrão por quem desejava uma silhueta mais esbelta.

“Alguns de fato não são legais, como a farinha branca, o arroz branco. E é muito fácil consumi-los em excesso. É comum comermos um pãozinho pela manhã. Na hora do almoço, teremos arroz, batata. À tarde, um snack, um biscoitinho. Fazendo assim, fica tudo muito branquinho, e acaba não sobrando espaço para fontes boas de carboidratos”, diz a nutricionista.

 

 

Normalmente, os alimentos que possuem níveis maiores de carboidratos simples são os mais desejados, mas também os menos recomendados: massas brancas, balas, chocolates. Apenas tenha cuidado para não generalizar: frutose e lactose também são ricos em carboidratos simples, mas possuem excelentes fontes de vitaminas e nutrientes.

Ao ser ingeridas, as moléculas de hidrato de carbono elevam muito rapidamente os níveis de glicose (açúcar) no sangue, causando picos de insulina, hormônio regulador de açúcar sanguíneo. Após essa ação, é comum sentir fome rapidamente, pois o nível de glicose continua baixando.

Para quem está querendo emagrecer e manter uma alimentação saudável, o ideal é reduzir a ingestão dos tipos simples de carboidratos, também para evitar a rápida indução da fome devido às alterações dos níveis de glicose. As estruturas complexas são aquelas formadas pela união de várias moléculas de carboidratos.

Geralmente, essas estruturas são associadas às fibras. De lenta digestão, conferem elevação lenta e gradual dos níveis de glicose, evitando picos de insulina. A energia é liberada ao organismo em um período mais longo.

Os alimentos ricos em carboidratos complexos são os cereais integrais (arroz, pão, macarrão), mandioca, batata-doce, vegetais, grão-de-bico, abóbora, aveia, brócolis, milho, ervilha e linhaça.

Lipídios (gorduras)

“Exercem várias funções importantes: são fundamentais para a síntese de vários hormônios, colaboram para a absorção de muitas vitaminas, são a principal fonte de energia estocada no corpo, funcionam como isolante térmico e atuam na síntese de sais biliares, importantes para a digestão”, afirma.

Para ter uma vida e alimentação saudável, é importante reduzir o consumo de alimentos ricos em gorduras saturadas, como manteiga, banha de porco, chocolate, bolos, massas folhadas e produtos feitos com carne, como salsichas e tortas salgadas.

O excesso de gordura saturada pode elevar os níveis de lipoproteína de baixa densidade, o “colesterol ruim” no sangue, aumentando o risco de doenças cardiovasculares. Por outro lado, as gorduras insaturadas podem contribuir para a redução dos níveis de colesterol ruim e aumentar os de lipoproteína de alta densidade — o “colesterol bom”.

As gorduras mais saudáveis são as monoinsaturadas e as poli-insaturadas, encontradas em peixes como salmão e sardinha; sementes, nozes, óleo de girassol e oliva, legumes, verduras e frutas, com destaque para o abacate.

São recomendáveis duas porções de peixe por semana, e uma delas deve ser rica em ômega-3, que ajuda a diminuir os níveis de diacilglicerol no sangue, a prevenir a coagulação e a manter um ritmo cardíaco regular.

O terceiro tipo de gordura encontrada na dieta é a trans. Gorduras trans naturais são encontradas em níveis baixos em alguns alimentos, como carne e produtos derivados do leite. As artificiais são produzidas por um processo de hidrogenação do óleo, usado em frituras.

Autêntico vilão, esse tipo de gordura é encontrado em comidas processadas, como biscoitos e bolos, e são empregadas para prolongar a vida dos produtos nas prateleiras.

Proteínas

Fazem a síntese e reparação dos tecidos musculares, bem como sintetizam hormônios, enzimas e anticorpos. Vale lembrar, no entanto, que utilizar proteína como fonte de energia pode queimar os músculos, o que conspira contra o desempenho.

Por esse motivo é que lembramos que o fornecimento adequado de carboidratos é a melhor maneira de evitar a degradação das proteínas musculares. “É por isso que não gosto de hierarquizar quando falo sobre a importância dos macronutrientes. Cada um deles tem sua função, não posso negligenciar a ingestão de nenhum. O que temos de ver são as proporções”, ensina Clarissa.

É fundamental não cair numa cilada muito comum — olhar para o alimento e enxergá-lo como provedor de apenas um tipo de nutriente. Por exemplo, acreditar que macarrão é “só carboidrato”.

Clarissa cita o caso do feijão. “Em 100 gramas desse alimento, teremos 14% de carboidrato, mas também 6,5% de proteína, 0,5% de gordura e 8,5% de fibra alimentar. O restante é água.”

Micronutrientes: um pouco já é o bastante

Eles valem muito mais do que pesam. “Os micronutrientes são muito importantes, mas o corpo necessita deles em menores quantidades, na casa dos miligramas, microgramas. São reguladores de nossas atividades biológicas, de funções do nosso corpo”, diz Clarissa.

O déficit de micronutrientes pode corromper os melhores esforços nos treinos, pois são fundamentais para reações específicas que resultam na formação de novas fibras musculares e participam do metabolismo dos aminoácidos, entre outras funções.

As vitaminas são compostos orgânicos que o corpo não consegue sintetizar. Elas atuam como parceiras das enzimas e são importantíssimas em diversas atividades do corpo. Aqui vai uma breve lista de micronutrientes importantes para uma alimentação saudável e os alimentos nos quais eles se encontram:

  • CROMO: facilita a ação da insulina e previne a degradação muscular (castanha-do-pará, tâmara seca, brócolis, tomate, carne vermelha, camarão, ostra).
  • VITAMINA D: exerce papel importante sobre os músculos e é determinante para a saúde óssea (salmão, sardinha, leite de vaca, ovo, cogumelo shitake).
  • MAGNÉSIO: desempenha papel importante na formação das fibras musculares (verduras verde-escuras, sementes, feijão).
  • ZINCO: favorece a ação da insulina e a proliferação de fibras musculares (carne vermelha, espinafre, sementes, feijão).
  • IODO: proporciona a formação dos hormônios da tireoide, que são fundamentais para a síntese de proteínas (bacalhau, iogurte, camarão).

Força veggie

Um dos mitos mais persistentes no que se refere à nutrição gira em torno da anemia atribuída aos praticantes de atividade física vegetarianos e veganos. Encontrariam eles a quantidade de ferro suficiente em vegetais e leguminosas para fazer frente aos esforços necessários para correr, nadar ou pedalar por vários quilômetros?

Ouvimos justamente uma nutricionista vegana, Paula Gandin, para derrubar mais esse mito. Vice-presidente do Instituto Brasileiro de Nutrição Funcional e conselheira da Sociedade Vegetariana Brasileira, ela é a prova viva de que não faz sentido questionar se alguém que se priva de carne pode praticar esportes.

Ela escolheu uma  modalidade que exige muito esforço físico, o futevôlei, como sua principal atividade física, e ainda pratica yoga e musculação, além de correr.

“Os dados são científicos. Não temos maior prevalência de vegetarianos e veganos em estudos epidemiológicos que analisam a quantidade de pessoas com anemia ferropriva (por carência de ferro) na população”, diz Paula.

Segundo a nutricionista, uma pessoa que migra da dieta onívora (que inclui carne e derivados) para a vegetariana ou vegana normalmente vai montar um cardápio com alimentos ricos em cereais, leguminosas, frutas, verduras, sementes e oleaginosas, presentes em uma alimentação saudável.

“Provavelmente, essa pessoa não consumia tudo isso antes de mudar a dieta. Dessa forma, vai abrir o leque.” Normalmente, a mulher atleta terá necessidades maiores de ingestão de alimentos ricos em ferro em comparação com homens que praticam atividades físicas, porque perdem parte desse nutriente com a menstruação.

“É preciso realizar exames para verificar isso. Se de fato for constatada a carência de ferro, num primeiro momento isso vai ser corrigido com suplementação, não com a alimentação”, afirma  Paula. O corpo absorve com maior facilidade o ferro encontrado na carne. Os vegetarianos e veganos se valem de leguminosas, soja e vegetais verde-escuros para suprir suas necessidades desse nutriente.

“A gente tem que ficar de olho se está se sentindo mais cansado, com necessidades de sono mais profundas, verificar se os cabelos estão caindo com maior frequência, se as unhas estão fracas. Nesse caso, é necessário submeter-se a exames”, recomenda a nutricionista.

É comum constatar episódios em que a carência de ferro não se deve à quantidade ingerida, mas à absorção. O cálcio compete com o ferro pelos mesmos receptores de absorção. Portanto, não se deve ingerir leite ou seus derivados para não complicar a absorção do ferro.

Curiosamente, o cálcio encontrado na natureza, em couve e brócolis, por exemplo, não tem esse efeito de competir com o ferro pela absorção. Já a vitamina C colabora para a absorção do ferro.

Paula não chega a recomendar que se tome um copo de suco de laranja para acompanhar a refeição — uma fruta na sobremesa pode cumprir bem esse papel, e saladas de verduras certamente também colaborarão.

 

As frutas têm papel fundamental na alimentação saudável, seja em uma dieta onívara, vegetariana ou vegana

Mito ou verdade?

Selecionamos dez questões sobre uma alimentação saudável que despertam dúvidas em muita gente. Jacqueline Moniz Anversa, nutricionista esportiva funcional da clínica Dra. Maria Fernanda Barca, esclarece todas.

1) Preciso comer de três em três horas? 

Não necessariamente. É importante dar preferência à fome, mas sabemos que o organismo tem necessidade de nutrientes com mais frequência porque o processo entre digestão, absorção, transporte de nutrientes e utilização deles leva aproximadamente três horas. Nasce daí essa orientação.

2) Comer ovo faz mal? 

Mito/ Números estudos científicos comprovam que a ingestão de ovos não conspira contra o emagrecimento desde que o consumo esteja dentro do limite diário de calorias e não influencie diretamente o aumento de colesterol.

3) O homem é o único mamífero que continua a ingerir leite depois que se torna adulto. Por esse motivo, não devemos ingeri-lo.

Mito. De fato, há pessoas, com maior prevalência entre negros e asiáticos, que produzem em menor quantidade a enzima que degrada a lactose. Mas dizer que ele não pode entrar numa dieta saudável seria falta de informação.

É um alimento riquíssimo em nutrientes, ajuda no ganho e manutenção de massa muscular e aumenta a saciedade.

4) Aveia contribui para reduzir o nível de colesterol?

Verdade. As fibras presentes na aveia ajudam a carregar o colesterol da dieta para fora do nosso organismo.

5) Líquidos durante as refeições engordam?

Depende da bebida. Refrigerante e sucos de frutas calóricos podem engordar. Depende da quantidade e da frequência. A água não vai engordar porque não tem calorias, mas pode prejudicar a digestão dos alimentos.

6) Cacau faz bem à saúde?

Verdade. Possui alto teor de antioxidantes e gorduras de boa qualidade, complementando uma alimentação saudável, proporcionam saciedade e promovem estado de relaxamento por elevar os níveis de dopamina e serotonina.

7) Café faz mal? 

Mito. Existem pessoas mais responsivas ao consumo do café e outras menos. Aos mais responsivos o café não faz mal porque o organismo deles metaboliza mais rapidamente a cafeína.

O corpo dos menos responsivos demora mais para metabolizar a cafeína. Nestes, o café pode promover efeitos colaterais como tremedeira, palpitações, mal-estar gástrico e até diarreia.

Em geral, a cafeína, em pequenas doses, produz efeitos positivos. Diminui o risco de depressão, melhora a sensibilidade à insulina e reduz o risco de placa de gordura nas artérias.

8) Pimenta é termogênica?

Verdade. A pimenta auxilia na queima de gordura graças a um composto chamado capsaicina, que aumenta a ativação de uma enzima responsável pela via da lipólise.

9) Carboidratos após as 18h engordam?

Mito. Nosso corpo não sabe ver horas. O mais importante é monitorar as calorias ingeridas ao longo do dia todo. Uma pessoa que faz exercícios ao fim do dia deve consumir carboidratos à noite para repor as perdas musculares e não acordar com muita fome pela manhã.

10) Açúcar refinado, mascavo e orgânico têm a mesma quantidade de calorias?

Verdade. A fonte é a mesma (cana-de-açúcar). O que muda é apenas o refinamento/processamento.

 

*Por Alessandro Lucchetti

*Fontes: Dra. Jacqueline Moniz Anversa (CRN- 3 35583), nutricionista esportiva funcional da clínica Dra. Maria Fernanda Barca.

Paula Gandin (CRN – 3 26070), vice-presidente do Instituto Brasileiro de Nutrição Funcional e conselheira da Sociedade Vegetariana Brasileira.

Clarissa Hiwatashi Fujiwara (CRN-3 32.841), nutricionista do Departamento de Nutrição da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso).

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